terça-feira, 3 de abril de 2012

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As polêmicas, aparentemente, não cansam de aparecer. E talvez esse seja o melhor caminho. São as peripécias por nós cometidas que nos alertam que temos que compensar nossos erros refletindo sobre os mesmos e ditando ações futuras que os evitem. Ao menos assim diz a lógica da conduta, o que claramente não é um exemplo muito prático na sociedade deste imenso país tupiniquim.
A mais recente confusão (é um apelido extremamente ameno, previno-os desde já) está, quem diria, alojada na Câmara dos Deputados. Já anda à espreita desde o final de 2011 um projeto de emenda constitucional (PEC), conhecida por PEC 99. Explico-lhes a situação, antes que passemos à questão do mérito.
Atualmente, temos elencados, no art. 103 da Constituição Federal, os entes que possuem autorização para propor ações diretas de constitucionalidade e ações declaratórias de inconstitucionalidade. Isso significa, em termos simples, que esses entes elencados no art. 103 da nossa Carta Magna são dotados do poder de abrir discussões que colocam em xeque a legalidade ou ilegalidade das nossas leis. São eles: Presidente da República, Mesa do Senado, Mesa da Câmara, mesas executivas e legislativas do Distrito Federal, o Procurador-Geral da República, o Conselho Federal da OAB, partidos políticos com representação no Congresso Nacional e confederações sindicais ou entidades de classes de âmbito nacional.
Pois bem, esses são os dizeres da nossa Constituição. Agora, sobre a supracitada PEC. De acordo com o seu texto, abre-se, pela emenda, uma alteração no art. 103, mais especificamente no inciso X, que dispõe sobre a capacidade das Associações Religiosas de postular para propor ação de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade de leis ou atos normativos frente à CF. Em outras palavras: entes não previamente regulamentados pela laicidade da Constituição podendo legislar em plenitude.
Senhoras e senhores, a novela Circo Brasil acaba de ganhar um novo capítulo. Não bastasse esse gigantesco contrassenso entre a laicidade do Estado e a presença tão marcante da bancada evangélica, que ousa subir o tom de voz como se fossem superiores a outras camadas, agora temos iniciativas para que o nosso texto fundamental seja modificado ao seu bel prazer, dando-lhes direitos inventados a partir de sua vontade de interferir em assuntos simplesmente porque vão contra o seu interesse.
Ah, mas o argumento defensivo existe, e ele é, a certo ponto, válido. Existe, sim, um conflito constante no campo ideológico envolvendo outros entes que contestam o lugar ocupado pelos religiosos que buscam transformar o Estado numa teocracia. Mas calma, tudo a seu devido tempo e lugar. Primeiro de tudo: não há qualquer problema de entidades e associações religiosas de reinvidicarem seus direitos. Isso é justo. São congregações de pessoas que possuem culto específico. A liberdade religiosa, prevista na nossa Constituição, permite isso. Também é permitido que professem suas ideias. Liberdade de expressão. Até aí tudo bem. Mas em hipótese alguma podem interferir no direito alheio, tampouco querer transformar a base do nosso ordenamento jurídico simplesmente para atender os seus anseios.
Existe uma razão para a existência do Estado laico. O Estado, enquanto ente que provê e fomenta todas as atividades e condições necessárias para a continuidade de uma plena vida em sociedade, precisa atender a todos os indivíduos de maneira equivalente. Não é o que acontece na prática, é verdade. Mas será que a solução seria uma quebra na laicidade do Estado? Já pararam para pensar nas consequências da aprovação desse PEC?
Discussão sobre legalização de drogas? Aborto? Pena de morte? Casamento gay? Direitos dos homoafetivos? Pesquisas de células-tronco? Campanhas de conscientização através de ensino da Educação Sexual nas escolas? Divórcio? Se depender deles, podem dizer adeus a tudo isso. Essa breve listagem de itens é uma composição de matérias, as quais encontram ferrenha oposição do grupo evangélico, o mesmo grupo que está levando a frente essa iniciativa da PEC. Na prática, portanto, as ações declaratórias de inconstitucionalidade podem se aplicar perfeitamente a temáticas como essas listadas. Lembremo-nos: uma vez “vitimada” por uma dessas ações, a matéria é paralisada por completo até julgamento pelo STF.
Quem foi que disse que a bancada evangélica tem qualquer respaldo para transformar a Constituição em seu canteiro de obras? E de onde foi que tiraram essa ideia? Alegam que a iniciativa é por conta da liberdade de religião. Sério? E por que então as entidades diretamente mencionadas e claramente favorecidas são exclusivamente as aliadas da bancada? A liberdade religiosa acaba a partir do momento em que os majoritários são favorecidos, é isso mesmo? Onde está menção aos hindus, ubandistas, muçulmanos, judeus, espíritas, seguidores do candomblém, dentre tantos outros membros de religiões minoritárias (numericamente falando)? Claramente percebemos que a iniciativa da PEC inclui única e exclusivamente um grupo ligado à corrente majoritária. E para onde vai o discurso da liberdade? Para o ralo, é para onde vai.
Completamente descabido: esse é só o primeiro e mais claro pensamento que surge ao imaginar a amplitude que esse PEC pode atingir. Já pensou, de repente quererem argumentar inconstitucional a matéria que trata sobre fabricação de anticoncepcionais? Criminalizar total e completamente o aborto, inexistindo sequer uma discussão sobre  o tema? Imagine você voltarmos à Idade Média com as correntes religiosas ditando com voz total os rumos que devemos ou não devemos tomar, usando de argumentos completamente descabidos dentro do ramo do Direito. A ideia de religião remonta a tradições, mas nem por isso ela deve ser o elemento norteador de uma nação inteira. É muito radical fazer essa comparação, mas lembrem-se qual foi o mais notável exemplo de união entre Estado e Religião da História. Isso mesmo: a Idade Média das Cruzadas, do Tribunal da Inquisição, das matanças de mulheres, da supressão do pensamento racional, e assim vai. É muito radical colocar isso dessa forma, bem sei. Entretanto, é uma prova de que é arriscado fazer essa junção. A religião promove sempre o bem dentre aqueles que a seguem. Um Estado teocrático (há quem diga que existe um risco do Brasil se tornar isso, pois compreendem como sinais prévios disso todas essas manobras das bancadas religiosas) é tudo, menos justo para com todos. A menos que todos sigam a mesma religião pelo Estado adotada, claro. Mas isso, logicamente, está muito distante da pluralidade palpável da sociedade brasileira.
Há quem diga, no final das contas, que estou exagerando. Será mesmo? Não me refiro à religião enquanto ideologia como culpada de tudo, e longe disso estou. Porém, o que é uma ideologia honrosa nas mãos de homens podres e sedentos de poder? Uma ferramenta de manipulação, desprovida de significado, com um único objetivo: o de comandar as populações e arrebanhar as pessoas. Alguém pode ter lembrado de Hitler ao ler isso, e com razão. Foi essa a tática usada por ele para manobrar toda a Alemanha em direção ao caos e à opressão.
Aceitemos, senhores. A laicidade do Estado é necessária. A partir do momento que tentamos impor ideias que remetam a um ou outro grupo, começa o desequilíbrio. Não bastasse toda a confusão que permeia a nossa política nacional, ainda aparece mais essa história de emendar a Constituição para aumentar os poderes de camadas que nada querem senão saciar sua vontade de comandar e de impor à toda a sociedade as suas ideias. Isso se chama opressão. Depois da ditadura militar, acho que o Brasil não quer mais nenhuma amostra dessa palavra. Só acho.


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Demorou mas saiu. Lembro a todos o seguinte: a ideia não é, aqui, provocar discussões por conta da religião à qual pertence grupo político X ou Y. A ideia é refletir acerca do que significaria a PEC 99 baseado no que o ser humano é capaz de fazer pelo poder. Pensemos, amigos, pensemos.

terça-feira, 27 de março de 2012

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Bom, também tenho meu lado de expressão na música. Já há algum tempo quando quero relaxar pego o violão e toco o que me vier à cabeça. Consequentemente, acabei tomando gosto pela composição. Então hora de começar a mostrar algumas das minhas composições. Futuramente (talvez) alguns vídeos com performance das músicas sendo tocadas rs.

Fiquem com uma dessas letras que vim a compor no decorrer do tempo. Espero que gostem. Em breve novo post, continuem acessando e dando aquela força pelo Facebook, comentários e tudo mais. Todo feedback positivo que eu receber é uma amostra de que o pessoal está gostando. Valeu!


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Desafio - Victor Bastos

Só falta me dizer que para todos os lados que ando
Não há o que se olhar
Se sobreviver se tornou difícil mesmo tentando
Não sei mais o que pensar.

Só queria poder conseguir seguir de cabeça erguida
Pensando nas memórias boas que tenho para guardar
Mera ilusão, não tenho nenhuma para usar
quisera eu ao menos ter algo para lembrar.

Enquanto o desafio da vida material prossegue em decadência
conforme avançamos e comprovamos a deficiência
De um mundo que simplesmente só sabe de lucrar,
diga-me quem você é e como pode me tirar
dessa montanha-russa maldita que me segue sem parar
antes que ela me atropele e destrua os sonhos e o querer
de somente uma alma querendo viver.

Largamos as vidas para sair jogando nessa roleta-russa sem fim
Temos mesmo uma arma neste jogo apontada para nós
A Era das Conexões só sabe nos sentir cada vez mais sós
E apesar de tudo isso eu ainda consigo te sentir em mim.

Não há de entender ou tentar saber o que concluir
Se o mundo dá voltas e não espera você se reconstruir
A dor é mais presente na vida do que a própria essência de viver
Nos resta tentar um jeito de, simplesmente, sobreviver

Tocar a vida já não basta se a essência não existe mais
E eu aqui pensando por que não fui capaz
de te dar uma razão nova de acreditar...

O desafio maior não é ser a razão para si
e sim saber dar a mais alguém o conhecimento
de poder lidar com esse momento...

Enquanto o desafio da vida material prossegue em decadência
conforme avançamos e comprovamos a deficiência
De um mundo que simplesmente só sabe quer saber de lucrar,
diga-me quem você é e como pode me tirar
dessa montanha-russa maldita que me segue sem parar
antes que ela me atropele e destrua os sonhos e o querer
de somente uma alma querendo viver.

segunda-feira, 26 de março de 2012

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Um dia em muito que já se passou, me foram ditas palavras que perduram mais do que deveriam. Como fantasmas que me lembram de um passado outrora tão familiar, pessoas que formaram quem sou hoje e seus pensamentos traduzidos pela voz ecoam por meus ouvidos. Talvez, mais do que deveriam.
Jamais poderia esquecer as almas que compuseram o meu lado mais feliz. Tampouco jamais serei capaz de agradecer, no dia em que a morte em minha porta bater, devidamente, a todos os que me construíram uma estrada por onde trilhar a vida. A despedida nem sempre é fácil. As palavras, nem sempre suficientes.
Muitos se disseram meus amigos. Quisera eu acreditar piamente que era verdade. Amigo, até onde meu cérebro conseguiu compreender, é uma pessoa que está ao seu lado em quaisquer dificuldades que o mundo apresente; que enfrente, ao seu lado, as tristezas; que chore em seus ombros, e permita que você faça o mesmo nas horas mais difíceis; que abrace para comemorar as maiores felicidades; enfim, uma pessoa com quem se possa tocar a vida e permitir que ela siga seu curso natural.
Talvez esteja cedo demais para concluir. Numericamente, minha idade não passa de uma fração da expectativa de vida do país em que vivo. Politicamente, jamais exerci uma função realmente necessária e essencial. Mas talvez, epifanias aconteçam sem hora marcada ou experiência adquirida. Talvez, a maior revelação possa se dar antes da morte, ou até mesmo antes de uma noite de sono. Quem sabe?
De uma forma ou outra, é mais fácil compreender a sua pequenez frente ao mundo quando se lembra de história de um grandioso. Uma pessoa que, há pouco conheço, mas demais reconheço o valor, certamente me dirá: “Quando se deseja ser grande, basta correr atrás e fazer por merecer.” Está certa. Mas e quando nos sentimos tão limitados, cercados por esse mundo tão ambicioso, frio e desumano? Por que acreditar num mundo que não mais conhece o significado da palavra honra? Por que acreditar num ser que não é mais ser: tornou-se um “ter”?
Talvez um recado a cada um de nós precise ser dado. Seria um ancião a dá-lo? Não se sabe. Por ora, espero que o mundo entenda as palavras de ninguém mais além de um adolescente. Mais ainda, se o mundo tanto premia sua juventude, que busque entender como entendo. É um pedido, uma súplica. Ou, como preferir: um ultimato.
A falsidade é a marca registrada da sociedade. A cobiça é sua segunda natureza. A frialdade se tornou uma virtude. Onde está o verdadeiro ser humano, perdido neste meio tão abandonado pelo real “ser”? Afinal, o que significa SER humano? É a pergunta cuja resposta consegui obter, a muito custo, mas que desejo que o mundo consiga entender.
Ser humano significa abdicar de suas comodidades e lutar pelo que acredita. Significa erguer a mão para um companheiro levantar-se. Significa saber chorar quando está triste, ao invés de esconder-se sob uma máscara. Significa reconhecer seu irmão quando o fita, olho a olho. Significa um abraço, um beijo, uma força, uma energia, uma poesia, uma profecia. Ser humano significa ser o futuro, confiado a quem sabe usar seus sentimentos para tornar o mundo um lugar melhor. Ser humano significa conscientizar-se de quem é, ter sua honra, buscar sua glória, querer o amor, entender a paixão, e, acima de tudo, ter sua identidade e seu caráter formado.  Será que somos humanos mesmo, no final das contas?
Não cometerei a hipocrisia que dizer que sou, já que tenho meus escrúpulos e falhas. Lamento meus erros, minhas desonestidades, meu passado e presente que ainda é marcado pela ausência de em quem confiar. Há tais, mas não talvez o suficiente para que um romântico sonhador como eu sinta-se seguro.
Haverá quem ria ao ler tudo isso. Não atribuo culpa a esse risonho. Deve rir mesmo, pois a vida deve ter uma felicidade, ou uma graça, em qualquer momento e lugar. Deve ser dotada de alegria, mas também deve ser levada com coerência. A quem rir, pense se não estaria cometendo o mesmo erro que quase todos nós cometemos, esquecendo de nossos erros e achando graça em quem se sente culpado pelo mundo em que habitamos. Será que somos humanos, no final das contas?
Há milhares de anos, guerreiros lutavam incansavelmente pela honra, para defender suas terras, seus filhos, suas mulheres. Davam suas vidas em nome de algo maior. Foram mártires? Não... foram pessoas. Hoje, quem fizer uma coisa dessas será considerado suicida, e, após seus 15 minutos de fama nos jornais, será esquecido... Somos humanos, no final das contas?
Renegamos nosso passado, só visamos um futuro cercado de máquinas que façam todas as mirabolantes idéias que vêm à nossa mente, enquanto usufruímos de um conforto não antes experimentado. No topo, uma minoria elitizada faz piada dos menos favorecidos. Julgamos-nos conhecedores do mundo, mas não sabemos reconhecer sequer o que sentimos. Percebemos a crueldade humana tão grande quanto os Andes ou o Himalaia, e nada fazemos. Somos humanos, no final das contas?

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É importante parar para pensar nesse aspecto. Digo uma coisa, amigos. Existe uma razão para que o ente biológico seja conhecido popularmente como "ser" humano. Pensem nisso.

terça-feira, 20 de março de 2012

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O ser humano, por ser dotado de capacidade intelectiva, acaba por deparar-se com uma gama formidável de decisões a serem tomadas no decorrer de sua vida. É esperado, pois, que seja possível atravessar a vida tomando as mais corretas decisões possíveis. Porém, não é isso o que se vê ao estudar a História humana. Decisões erradas custaram, e ainda custam, muito caro, o que prova a necessidade de uma reflexão sobre qualquer decisão a se tomar.
A princípio, a primeira grande escolha do ser humano em sua vida consciente é justamente sobre a reflexão: viver ao acaso, entregue aos instintos e desejos, tomando a vida como uma passagem a ser sentida ao invés de praticada, ou uma vida enraizada no pensar, conseqüentemente praticada de forma efetiva e racional, na qual cada passo dado seja antes pensado.
Sobre essa única decisão, a reflexão por muitas vezes acaba sendo feito sem uma maturidade plena. A razão disso reside na natureza humana: como ser pensante, uma existência animalesca, desligada de qualquer tipo de estudo aprofundado acerca das escolhas tomadas, inevitavelmente contraria a raiz humana. Prova disso é que a reação normal de um indivíduo, ao notar uma decisão errada, é voltar atrás e buscar consertá-la.
Dado esse passo inicial, a prática de uma atividade reflexiva se dá intensamente. Desde o jovem que optou por seguir a carreira jurídica, passando pela moça que escolheu a prática do lesbianismo, até o filho que, vendo seu pai a agonizar, decidiu desligar os aparelhos médicos que o mantinham vivo, têm-se evidências da grandiosidade do poder de uma decisão, e da importância de uma reflexão acerca dessa decisão. Os exemplos são inúmeros de que o cérebro humano exerce uma importância além dos conceitos da biologia. Isso é uma verdade incontestável.
Essa atividade pensante acaba por refletir em todas as esferas do indivíduo. Uma delas é a sua manifestação acerca dos assuntos do mundo que o cerca. Daí advém a dicotomia conceito x preconceito. Para se formar uma opinião, primeiro muito se deve pensar. “O buraco é sempre mais embaixo”. É essa a primeira frase que deveríamos manter em mente quando imaginamos que temos uma opinião formada sobre determinado assunto.  Principalmente em se tratando de assuntos polêmicos (para além das polêmicas dos mamilos). Já pensou no que resulta uma opinião isenta de reflexão acerca de, por exemplo, a questão do aborto?
Aborto... é assunto batido, talvez. Mas qual assunto não o é? Se pararmos para avaliar, quanto mais martelado determinado tema, melhor resolvido ele acaba sendo, porque abrange o máximo possível de averiguações. Pois que assim seja.
Aí me vem a leitura do Código Penal, como não devia deixar de ser. Em noção apresentada pelo ilustríssimo mestre Celso Delmanto, conforme leitura que estava fazendo: “Aborto, para efeitos penais, é a interrupção intencional do processo de gravidez, com a morte do feto”. O diploma defensor dos nossos réus (conforme palavras do grandioso mestre Nasser Netto) trata uma definição friamente técnica, e com essa mesma abordagem prevê as hipóteses de aborto que o Código há de avaliar. Há a previsão de uma condição de aborto que não resultará em penalização à praticante, tal qual seja, conforme o art. 128:

  Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:

        Aborto necessário
        I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;

        Aborto no caso de gravidez resultante de estupro
    II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

O debate é mais social do que jurídico. É claro que, a olhares do Direito, a discussão toda vai girar em termos do ocorrido, o famoso “cada caso é um caso”. Porém, a questão ainda está passível de discussões, como afinal também está qualquer outro delito previsto no nosso diploma criminal. Em tese, isso poderia ser abordado em texto posterior, toda a convenção de normas do Direito advém justamente do consenso da sociedade. O Direito é fruto dos entendimentos sociais, porquanto deverá estar em consonância com os ditames dos estratos componentes da respectiva sociedade na qual se insere.
Para além dos debates jurídicos, antes de neles adentrarmos o entendimento social precisa estar focado num ponto do qual deriva o Direito a se formar. Por mais que seja uma espécie de “porto seguro” por já ter uma norma prevista, a questão do aborto ainda gera muitos debates pelo significado social. Quantas vezes não caímos no diapasão, por exemplo, do significado religioso do aborto frente ao significado médico? Mais especificamente, quando não caímos no debate entre moral e Direito? Dizer o Código Penal que existe a possibilidade da permissão do aborto em caso X, mas grupos sociais avaliarem que não há caso nenhum. Esse debate sempre ocorre, localizado ou amplo, e o resultado desses embates pode vir a ditar mudanças na legislação.
A dúvida maior é relativa aos embates da questão moral. Pode ou não pode? Na verdade, em âmbito moral, deveria ser “deve ou não deve”. Coloquemos dois exemplos aos olhos de uma possível reação da sociedade (baseado em situações similares anteriores). Exemplo A: cidadã, após consumada a relação consentida, contrai gravidez e, não desejando o filho, busca o procedimento do aborto. Exemplo B: cidadã, após consumada relação sem consentimento, sendo ela vítima de estupro, contrai a gravidez e passa a aguardar filho do homem que a estuprou e, não desejando o descendente, busca o procedimento do aborto.
“E agora, José?”. Pois é. E agora? A diferença resta clara como cristal. Geralmente, bastaria a verificação fática para que o entendimento fosse que, no caso A, não cabe o aborto, enquanto que no caso B, cabe. Esse é o ditame do Código Penal. O diapasão entre o pode e o não pode resta aberto, porém, nas camadas sociais. Em alguns momentos ocorre até mesmo a inserção dos Direitos Humanos na situação. Acaba existindo uma opinião que considera o aborto praticamente um homicídio, independente da situação, imperdoável em sua essência.
Conforme mencionei no começo do texto, a questão está envolta pela necessidade de uma decisão. Mais além vou eu: a questão está envolta por uma reflexão bastante intrigante. O que gera todo esse agravante intenso na questão do aborto? Se muitos o consideram um homicídio sem tirar nem por, o que o torna tão impensável frente a outros homicídios?
A concepção social parece indicar que, por se tratar de um ente sem defesa nenhuma perante o aborto, a prática é taxativamente condenada. Ademais, um ente por toda uma vida pela frente, todas as possibilidades, tirada tendo a sua chance de fazer parte do mundo. Tudo isso ruma à enfática negativa. Longe de questionar o mérito da questão, mas isso não me parece suficiente para transformar o aborto em coisa mais horrenda do que homicídio, seja ele qual for. A vida do indivíduo não é tirada da mesma forma? Independente de idade, de perspectiva, de situação... vida é vida. Todas tem o mesmo valor. Logo, não caberia uma visualização do aborto como algo horrendo além da perspectiva.
É claro que com pé atrás digo isso. Caros leitores, fatalmente estamos tratando de algo com o qual não temos condições de concordamos em unanimidade, não pelo menos relativo ao parecer final. Entretanto, hemos de concordar ao menos na máxima acima dita: vida é vida, e todas tem o mesmo valor.
Partindo desse princípio de valorização da vida, como será que poderia se sentir uma vítima de estupro que espera por um filho do estuprador, descendente este que não deseja? Indizível. Essa é a palavra. Indizível. Indescritível. Um terror indubitável. Uma assimilação inexequível. Não há como saber o que se passa no psicológico e no emocional de uma pessoa nessa condição. Cada caso é um caso. Algumas podem vencer o trauma, e outras podem simplesmente bloquear tudo e permanecer eternamente marcadas. Nesse ponto, antes de discutir o mérito do aborto ou não, temos que refletir e repensar a nossa própria condição como julgadores. A missão? Imaginar-se no lugar dessa pessoa. Impossível, não é? Portanto, julgar como horrendo não podemos.
A religião condena? Condena. Tem sua visão para tal? Com certeza. Porém, nem isso é motivo. Esse mérito de responsabilização da religião, seja ela qual for, por questões como o aborto hei de abordar futuramente em outra oportunidade, pois a polêmica é imensa.
Questão posta, meus amigos: a partir de que momento podemos nos redimir perante a sociedade por conta de uma conduta reprovável por nós cometida? Essa pergunta é importante de se fazer, porque é o primeiro passo para compreender que reprovar uma conduta não se pode fazer simplesmente por discordância. Isso é o mais básico. Adicione aqui essa polêmica gigantesca do aborto. Será que é mesmo reprovável? Como agiríamos se estivéssemos no lugar da cidadã da situação A? E no lugar da cidadã da situação B?
Recai agora uma observação: será que nos levarmos pelo lado emocional é certo nessas questões? O emocional é subjetivo. Subjetivo NENHUM pode se sobrepor ao de outrem. Tanto para isso existe o Direito: traçar o objetivo num mar de subjetivos. Mais do que condenar ou proteger, devemos pensar. É claro que nenhum ser humano está acima da vida e da morte, assim como também nenhum ser humano tem o poder ou a condição de julgar baseado em seus valores individuais. É a sociedade quem manda. E para mandar, precisa-se separar o subjetivo do objetivo. Individualidade por individualidade, sequer viveríamos em sociedade, para começo de conversa. A vida coletiva proporcionada pela sociedade demanda que façamos concessões de opiniões e pensamentos pessoais em prol do conjunto. Posicionamentos individuais existem, e são importantes para construção do nosso caráter. Coletividades dentro da sociedade podem, e devem, se juntar e se fazer ouvir. Porém, o debate não pode ser guiado pela emoção. Se queremos um Estado justo, um conjunto de leis que abranja da maneira mais ampla possível todos os indivíduos, o caminho a ser traçado é o objetivo.
Julgar por julgar é fácil. Condenar é fácil. Proteger é fácil. O difícil é pensarmos numa linha que nos permita uma conclusão objetiva. Se você, amiga leitora, ousar se colocar numa posição dessas, sua decisão seria fácil? Decerto que não. Nunca é fácil decidir. E, como ressaltado no começo do texto, uma vida toda pode ser traçada a partir de uma escolha. Pesa demais a responsabilidade. Se queremos o bem de todos, a primeira coisa que devemos fazer é acreditar que não existe responsabilidade pequena o suficiente para nos transformar em donos da verdade. Por menor que seja, há muito em jogo. Decidir por decidir, cada um faz a sua decisão dentro dos limiares da Lei. Decisão individual, liberdade de expressão... são direitos nossos. Mais do que sobrepor os nossos aos de outrem, devemos respeitá-los. A missão não é fácil, mas está aí de maneira obrigatória a vencermos.



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Não é fácil escrever sobre um tema como esse. Mais uma vez, espero tão somente que o debate se proceda e busquemos, aliados à razão, um entendimento claro e que possibilite uma visão mais ampla da questão. Ninguém é ignorante, mas também ninguém é sábio. Pensar sempre vale a pena. Eu que o diga.

domingo, 18 de março de 2012

Posted by Victor Bastos | File under :
Frialdade tal essa, não sei dizer
Pois que terra escura e quente é essa?
Sinto-me preso a ela, mas consigo voar
Por que minha mente esta peça está a pregar?

Se volto um pouco, posso ver
Todos os que conheci num verde campo
Chorando, gritando, quem sou eu, pois?
Nada sei, nada sou, só posso voar
com asas que não me pertencem.

E a mais terrível das sensações
Perder quem amei, estar longe e não mais poder ter, olhar
Enquanto a carne apodrece, o espírito floresce
Na luz do Sol a iluminar minha errante alma a planar.

Mas ainda nada sei, pois nada mais sou.
Só quis ter tempo para dizer, para fazer
Não fiz, tolo fui.
Ah, mas que hei eu de reclamar?
Se bastou um sorriso seu para meu conturbado espírito acalmar.

Se chora, não sei
Mas lágrimas talvez cairão
sob o frio chão.
E embaixo e acima, ao mesmo tempo, eu estarei
Você não me vê, não me sente, mas lá eu estou.

A luz me cerca, e a escuridão dentro de mim se ameniza.
Conforme o tempo passa, aprendo com essa solidão conviver.
Não gosto, não quero, mas me dizem que preciso saber.
Mas de um dia para o outro, lá estou eu a pensar,
e você aparece, planando ao meu lado,
do nada, minha mão a segurar.

E vamos juntos embora, seguir o que o céu pode mostrar
E vamos juntos seguros, pois você está lá comigo a voar
E vamos juntos felizes, pois um ao outro sempre irá amar
E vamos juntos eternos, eternos amantes, deveras mortos, a planar.

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De bônus para o fim de semana, mais uma poesia de minha autoria. Esta se chama "Pelo Etéreo ao Voar". Espero que gostem. Boa semana a todos!
Posted by Victor Bastos | File under : ,
As observações que podemos fazer relativas à sociedade internacional são diversas. A interação entre os Estados é dinâmica, apesar de às vezes desigual, e nunca se pode parar de avaliar as possibilidades de inovação ou risco de retrocesso. Poderíamos aplicar, a grosso modo, o mesmo princípio de relação entre seres humanos no âmbito social: cada um com seu posicionamento, e, para conviver em sociedade, acaba-se por abrir mão de X ou Y em prol de Z. Os interesses em comum são apreciados, e as rixas (tentam) ser postas de lado em benefício da boa convivência. Essa é a sociedade internacional. Ou, pelo menos, assim deveria ser. Existem questionamentos acerca dessa sociedade que precisam ser feitos.

Oquestionamento é relativamente simples. O que é que regula essa relação entre os Estados? A resposta é o que se chama de Direito Internacional Público. Por definição, Direito Internacional Público seria o conjunto de normas jurídicas criadas pelos procedimentos de produção jurídica da própria sociedade internacional, transcendendo o âmbito do Direito Interno (ou seja, do Direito estatal).
Diz-se, então, que o que rege a sociedade internacional é esse conjunto de normas de Direito, Direito este que transcende as barreiras dos Estados. A partir do Direito Internacional Público há de derivar o que se conhece por Relações Internacionais.

Pensemos, porém, por um momento, na seguinte situação: um grupo de 191 pessoas convive em uma ilha. Em determinado momento, a convivência se torna abalada por conta de conflitos dentro do grupo. Em prol da continuidade da conviência, o grupo compactua, criando uma série de diretrizes que deverão ser seguidas para aquela convivência persistir. Das 191, 10 discordam das diretrizes, e preferem se afastar daquela sociedade. As demais 181 aceitam o pacto celebrado e seguem as diretrizes, coexistindo em harmonia.

Transformemos a ilha no planeta Terra e as 191 pessoas em 191 países. Aqueles que aceitaram o pacto celebrado compõem uma sociedade internacional regida pelas regras com as quais compactuaram. E o que ocorreu com os 10 que discordaram? Estão fora da convivência, tão somente.

Essa situação coloca em xeque o próprio conceito de Direito Internacional Público. Entendendo-se Sociedade Internacional como sendo o conjunto de países que se interrelacionam, podemos compreender que, na prática, não há um "Direito" Internacional, mas tão somente Relações Internacionais. Ora, pensemos: dentro da União Europeia, recentemente o Reino Unido e a República Tcheca se negaram a assinar o novo pacto fiscal. Essa negativa custou-lhes a convivência com os demais países dentro da União? Foi posta em xeque a permanência deles na União por conta disso? É claro que não. Em outras palavras: não existe uma força coercitiva dentro dos pactos, havendo a possibilidade de um país aceitar ou não seus dizeres, ou simplesmente decidir de participa ou não participa de determinadas convenções. E qual é mesmo uma das bases da existência do Direito, segundo mestres como Paulo Nader e Miguel Reale? Isso mesmo: coerção!

Não há Direito sem o efeito coercitivo, ou o Direito se reduziria a mera convenção social de regras de menor expressão, sem a obrigatoriedade de cumprimento aos seus dizeres. Isso não existe nas relações entre as entidades do Direito Internacional Público. O Brasil pertencer a determinado pacto não significa que ele obrigatoriamente precise seguir tudo o que diz. A partir do momento que não mais desejar, ele pode retirar sua assinatura do pacto. Não há, aqui, uma obrigatoriedade de cumprimento dos dizeres que a sociedade internacional profere. Cada nação é perfeitamente livre para construir sua convivência com as demais, não estando presa às amarras de alguma obrigação. Em outras palavras: não há um Direito Internacional Público.

Não existindo um poder central no planeta, que possua a função que possui o Estado frente à sociedade humana, não há de onde emanar o poder coercitivo inerente ao Direito. O que se tem, em realidade, é a convivência das entidades da sociedade internacional resultando em alinhamentos de posicionamento, priorizando interesses em comum em prol da harmonia das nações.

Alguém pode vir perguntar: mas e a ONU? Respondo-lhes: ONU significa "Organização das Nações Unidas". Nações Unidas. ONU em si não é uma entidade individual que possui autoridade internacional, mas uma reunião de países signatários que se utilizam da entidade para traduzir os interesses e colocá-los em pauta nas discussões internacionais. Talvez o mais claro exemplo disso seja o episódio da Guerra do Iraque, no início do século atual. Os Estados Unidos responderam perante à ONU por suas ações? Se a ONU possuísse um poder individual de caráter internacional, ou seja, fosse dotada de coerção, as consequências das ações capitaneadas pelos norte-americanos teriam sido diferentes. Mas, como a ONU não é detentora desse efeito coercitivo, os seus dizeres não possuem obrigatoriedade de cumprimento. Daí advém dizer que não há um Direito Internacional Público.

Relações Internacionais. Esse é o nome que deveria ser utilizado para se tratar do âmbito internacional. Enquanto não existir uma entidade centralizada, dotada de coercibilidade, não há de se falar em um Direito Internacional Público.

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Bom, leitores, desculpem os dias ausentes de posts. Não andei com possibilidades de post. Entretanto, a bola está com vocês. O que acham sobre essa reflexão acerca do Direito Internacional?

quinta-feira, 15 de março de 2012

Posted by Victor Bastos | File under :
Na vida, sempre que traçamos uma meta, buscamos também os melhores meios para nos possibilitar alcançar aquela meta. O normal é não hesitarmos, correndo atrás incansavelmente daquilo que almejamos.
Vejo as coisas de maneira curiosa toda vez que são divulgados os resultados do ENEM, por exemplo, principalmente da edição de 2010, que originou essas ideias. As discussões logo tomaram início, tendo em mãos ferramentas para comparar o desempenho das escolas participantes. Destacaram-se, como sempre, as escolas conhecidas por sua rigidez e eficácia especializada em vestibulares. Gigantes da matemática, heróis da física, mestres da química, e assim sucessivamente... Esses são os ícones produzidos de tais escolas. Para o mundo de hoje, esses são os elementos que irão se destacar. A sociedade atual prima pelo domínio das ciências tidas como “nobres”.
Por primar por esse domínio, a própria sociedade acaba por cultivar, chamemos assim, “novos membros” que sejam capazes de trazer inovações nos campos do conhecimento humano, em todas as áreas imagináveis. Ou será que não?
Não é difícil encontrar crianças, com idade padrão de curso entre a 1º e 4º série, que gostem da matéria de artes. Nessa idade, ainda há o prazer majoritário de ter uma aula que trate de trazer uma limpeza e clareamento da mente, para posterior manifestação sob a forma de desenhos. É fácil observar: nos primeiros anos do ensino fundamental, ou em alguns casos até mesmo em anos mais avançados, os eventos escolares, como feiras que tratam da exposição de desenhos e incitam a participação dos alunos, são bem recebidas por parte dos discentes.
Entretanto, conforme avançamos no decorrer dos anos letivos e chegamos ao limiar do ensino fundamental e período do ensino médio, as coisas mudam, e muito. Por conta da pressão dos concursos, vestibulares e tudo mais, as atenções se voltam quase que exclusivamente para as disciplinas que tendem a se tornar as mais problemáticas no processo de seleção das instituições de ensino superior, ou até mesmo nas próprias escolas, que cobram incansavelmente em prol do bom desempenho do seu alunado nas provas de faculdades.
Isso é um reflexo social. O mundo está em plena vertigem com o avanço tecnológico, que é norteado pelo conhecimento da matemática, física, química, biologia, dentre outras matérias. Acabamos por ver um mundo destinando os jovens cada vez mais aos ramos mais “frios” do conhecimento humano. E acaba que não basta exigir domínio dessas áreas: demandamos inclusive que as demais, aquelas que não entram diretamente na montagem de um currículo respeitável pela sociedade cientificamente viciada, sejam desprezadas.
Podemos pensar o que for, mas, em verdade, o que se mostra de previsão para o futuro é que, caso a realidade não seja alterada de alguma forma, as gerações que estão por vir estarão muito mais informatizadas do que dotadas de conhecimento cultural (ainda que, segundo a antropologia, todo ser humano é dotado de cultura, seja ela quão diversa for). Aqui, uso “conhecimento cultural” no seu sentido mais amplo possível, que é o disseminado na sociedade, compreendendo conhecimentos humanos como História, Artes, dentre outros.
Não é essa a primeira manifestação sobre o nosso método de ensino atualmente consolidado, e tampouco será a última. Do Oriente ao Ocidente, do Norte ao Sul, as nações primam pelo desenvolvimento confiável nas ciências, ensinadas desde muito cedo e incentivadas o quanto antes. É exatamente por isso que, hoje em dia, há um preconceito por áreas como a Música, o Teatro, e, consequentemente, aqueles que optam por tais. É muito fácil e comum dizer que essas áreas são muito interessantes, mas a máscara criada passa a cair quando vemos um pai ou uma mãe que reage quando ouve da filha ou do filho que este quer seguir a área de Artes Cênicas, por exemplo.
Há exceções, é claro. Não podemos generalizar. Ainda há pessoas que encontram a valorização seja em qual área for, seja isso norteado pelo amor familiar ou pela aceitação, ou talvez pela própria concepção de vida que se tenha. Mas uma coisa é certa: a sociedade, enquanto ente, não tem o devido respeito e valorização. Passamos a acreditar que inovação nada mais é do que a tecnologia nova. Passamos a aceitar a matemática como a máxima referência de inteligência do aluno. Os cursos de ensino superior passam, há muito tempo, por uma segregação: aqueles que cursam áreas tidas como nobres (Medicina, Direito, Engenharia, etc.), e aqueles que cursam as áreas tidas como “só por obrigação” (como as relativas às Artes).
Queremos ver um futuro diferente? Pois então devemos pensar diferente. Não devemos desvalorizar alguma coisa só porque ela não é a matéria que mais dá trabalho numa prova de vestibular. E, talvez, o próprio vestibular deva ser repensado. No momento, estamos formando não profissionais, mas robôs, porque o modelo que nós mesmos adotamos está centrado na fria letra ou no frio cálculo. Não há valorização pelo envolvimento cultural. Mais pessoas se interessam por uma nova fórmula de Física do que por um escritor ou um poeta. As Ciências têm sim o seu papel de nortear o conhecimento humano, mas por que isso significa que devamos nos esquecer ou desvalorizar ramos que são iguais reflexos do nosso conhecimento e sabedoria, como a Literatura?
Será mesmo que atores de teatro devem ser lembrados pela sociedade somente na entrega de prêmios em badaladas cidades dos Estados Unidos e Europa? Será mesmo que músicos só possuem a sua importância no momento em que estão no palco, exibindo seu trabalho? O mundo é plural, o ser humano também. Está na hora de repensar. Se todos somos seres humanos, independente de que atividade formos nós exercer ou que ramo escolhamos seguir, todos nós devemos ser valorizados da mesma forma. Estar uma área em destaque em determinado momento histórico é normal. Entretanto, desvalorizar as demais por conta desse destaque significa abrir mão de esferas da manifestação humana perante o mundo em que vive. Inovação não é só tecnologia: é um novo olhar, uma nova manifestação, podendo ser um chip, um aparelho, uma frase ou uma poesia. Repensar é necessário. O mundo pode lidar com essa mudança? 

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Pensar sobre educação é uma coisa séria. Mais do que refletir sobre a importância de cada área, é saber valorizar todas as esferas de inteligência humana e suas manifestações. Se o mundo tem problemas hoje, boa parte é por conta dessa nossa aparente falta de capacidade de fazer a devida atribuição a cada manifestação do saber humano. Vale a pena pensar sobre isso, sem dúvida.