A
sociedade nada mais é do que uma armadura, adornada por falsas pedras
preciosas que recebem nomes como "moralismo", "bons costumes", dentre
outras nomenclaturas. Que tal
repensar um pouco desse aspecto? Será que os homoafetivos, por exemplo,
pensam que a sociedade está aí para apoiá-los? E será que está mesmo? Hora de repensar alguns valores que regem nosso estrato social.
Não
é segredo para ninguém que a sociedade é dinâmica. Por mais que
tentemos entender e acompanhar as mudanças que se sucedem, torna-se
difícil de discernir o antes e o depois. Isso é explicado pela
Antropologia: por estarmos acostumados com a nossa própria cultura, toda
mudança a ela atrelada é percebida de maneira muito sutil, e
rapidamente é integrada à sociedade como algo rotineiro. Resultado: para
percebermos mudanças significativas, o espaço de tempo a se avaliar tem
que ser relativamente bem grande. Um exemplo disso está no choque de
ideias entre as gerações: com certeza nossos pais pensam de maneira
diferente da que pensamos, e com certeza nossos filhos também pensarão
diferentemente de nós.
Até aí, é simples: estamos acostumados à nossa própria cultura, e todas
as mudanças nela nós incorporamos como algo rotineiro. Porém, e quando a
mudança for tão significativa que é um prenúncio de uma nova
consciência social?
Fazendo uma viagem no tempo de volta às décadas de 1950 e 1960, por
exemplo, talvez a visão que hoje, em 2011, temos das mulheres na praia
de Copacabana, fosse, à época, algo tido como ultrajante. Para a cultura
da época, estar em Copacabana cercado de mulheres de biquíni seria algo
impensável, inclusive reprimível (lembram do famoso presidente
Jânio Quadros, que dentre outras medidas proibiu os biquínis em certos
casos? Imagine o que ele diria do Rio de Janeiro e outras cidades
litorâneas hoje em dia).
Entretanto, todas essas mudanças pelas quais passamos nós fomos capazes
de incorporar com certa facilidade. Não foi difícil (mas sim custoso)
sair da rotina do ar livre e passar a conviver com a computação, assim
como também não foi difícil (novamente, mas sim custoso) sair da infância regada a
ioiô e do pião às horas acompanhado de Mario, Luigi e as demais
personagens da Nintendo. A nossa cultura foi capaz de adquirir todos
esses novos traços simplesmente por ser uma tendência comprovada: a
tecnologia, afinal, avançava exponencialmente, e era somente questão de
tempo para que fosse universalizada, por assim dizer.
Mas a mudança que trago aqui para refletir (e criticar a sociedade, não
só brasileira, mas tantas outras), não está ligada a um hardware
promissor. A mudança que aqui trago para debater não está ligada a uma
nova moda. Uma mudança
está ocorrendo, e ela envolve algo muito mais complexo do que
tecnologia: envolve concepção humana.
O crescente número de manifestações e oficializações relativas aos
casais homoafetivos significam uma mudança que veio para ficar.
Entretanto, a sociedade não está se mostrando capaz de lidar com as
mudanças da maneira que era esperado. Não que seja uma mudança radical
no sentido de extrema, pois admitamos: é algo que deveríamos ter a
capacidade de aceitar tranquilamente. Entretanto, existe uma espécie de
choque de forças sociais, num tremendo embate, o que torna o cenário dos
reconhecimentos caótico.
Explica-se: quando se fala em choques de forças sociais, diz-se respeito
a embates de focos de ideologias. Uma amostra desse choque de forças
sociais (regadas a ideologias fortemente nessas forças enraizadas)
encontra-se, de maneira curiosa, nos nossos plenários. Fugindo um pouco
ao rumo da questão dos casais homoafetivos, podemos citar a situação das
correntes religiosas nas Casas da área política. Parece novidade ver o
setor evangélico querer impor ideologias religiosas no teor das nossas
leis? Claro que não. E aí mora a pergunta: mas o Estado, conforme prediz
a nossa Constituição, não é laico? Se o Estado é laico, o elemento
religioso não pode estar ligado às instituições e bases estatais. Assim
sendo, por que é permitido que o ideal religioso ainda seja centro de
tantas polêmicas políticas? A resposta para isso é simples: a religião,
por ser um costume à nossa cultura intrinsecamente ligado, está
disseminada de maneira ampla, e acabamos por errar (sim, errar) em achar
que ela pode existir em todas as esferas da nossa convivência. O choque
entre essa errada premissa e os dizeres da nossa norma fundamental são
um exemplo de conflito de forças sociais.
Voltando à questão dos homoafetivos. A História mostra que a chegada de
novas ideias não é sempre fácil. Quanto mais “revolucionária” a ideia
nova for, mais perigoso será a sua adequação aos costumes de determinada
sociedade. Imaginemos uma sociedade extremamente conservadora vendo uma
verdadeira explosão ao redor do mundo de manifestações em prol de algo
que eles discordem. Em outras palavras: tentemos imaginar o que o
Vaticano tem a dizer sobre essa chegada massiva dos pró-homoafetivos.
Sem perguição ao elemento religioso, afinal sou católico. Porém, a
religião (ou pelo menos uma maioria absurda delas) é contrária a essa
ideia de uma liberalização da condição de homoafetivo. Sendo o elemento
religioso algo muitíssimo arraigado à sociedade e aos costumes da
sociedade brasileira, temos aí o palco montado. De um lado, os
pró-homoafetivos, adeptos de uma sociedade com uma base reformulada. De
outro, aqueles conservadores, ligados às suas crenças tradicionais que,
majoritariamente (ou quase por unanimidade), condenam esse tipo de
pensamento.
De onde é que veio o pensamento de que cada um de nós é melhor do que o
outro a ponto de querer sobrepor a vontade e ideologia? Por incrível que
pareça, vem da natureza: o ser humano é o animal mais egoísta de todo o
complexo reino animal. Filosofica e sociologicamente isso é fácil de se
verificar, pois até a própria existência do Direito é uma evidência
desse caráter irresponsável do homem enquanto ente.
Isso aí é somente avaliando uma única esfera do ser humano em sociedade.
Será que seria a mesma coisa se fosse avaliado individualmente? Talvez
não, e a explicação é simples: o ser humano, isento do senso de
reprovação social, passa a ser mais adepto de ideias diversificadas. Daí
advém a ideia de um homem mais "humano" no sentido central da palavra
quando está por conta própria, pensando com seus próprios botões, alheio
às firulas sociais.
Mas e quanto às camadas sociais liberais, aquelas que estão em prol do
homoafetismo? Estariam certas, ou seria um erro futuro tal apoio? Cada
perspectiva possui uma resposta para essa pergunta. Sob o foco de luz da
"solidariedade humana" e do conceito de harmonia social, estão
certíssimos. Afinal, uma sociedade humana deve apresentar coesão e laços
equilibrados (ao menos em teoria) o suficiente para manter esse
agrupamento estruturado. Já no que tange a perspectiva da vanguarda de
valores, ocorre um problema: os valores predominantes na sociedade atual
não são, em todo, condizentes com os que seriam construídos a partir da
aceitação. Ainda há, inclusive, muito preconceito a ser vencido. E esse
preconceito está inerente em nós mesmos. Um exemplo: de 10 pessoas,
talvez 4 ou 5 pensariam que uma criança criada por um casal homoafetivo,
seja ele composto por dois homens ou duas mulheres, seria capaz de
crescer sem sofrer efeitos por conta disso. Os demais pensariam que
alguma "sequela" seria deixada. Em outras palavras, por conta de uma
pressão social, passamos a ter uma ideia de que a família é composta,
obrigatoriamente, por pessoas que encaixam-se no perfil socialmente
aceito para tal, quando na verdade sabe-se que existem casos e casos: há
casais homoafetivos muito mais capazes de cuidar de uma criança do que
muitos casais heterossexuais por aí, que, assolados por males diversos (e por vezes alheios à sua vontade),
seriam comprometidos com relação à capacidade da criança se desenvolver
(ausência em demasio, não ser modelo de valores, descaso com a criança, e assim vai).
No final das contas, resta um diapasão: sociedade x senso social. Existe
grande diferença entre um e outro, e talvez nunca alcancemos plenamente
esse último. Mas quem sabe? O ser humano evoluiu da roda ao carro, e do
carro ao ônibus espacial. Evoluímos em questão tecnológica, e agora
estamos à beira de uma revolução ideológica. E então, será que vai?
_______________________________________________
A
polêmica vai aparecer, e disso tenho certeza. O intuito desse texto não
foi o de conturbar entendimentos religiosos, costumes ou desrespeitar
quaisquer crenças e entendimentos. A questão aqui posta é: a sociedade
se julga conhecedora de si e justa por concepção. Onde está a justiça
quando dois homens são confundidos com um casal homoafetivo e, por isso,
são atacados? Há muito a se pensar. E é com isso na cabeça que convido
os queridos leitores a se manifestar. Qual é o seu posicionamento frente
às uniões homoafetivas?
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